No começo deste mês, os cafezais do Sul de Minas Gerais foram tomados por pequenas flores brancas. A florada é um espetáculo que dura poucos dias, mas os olhos treinados dos produtores sabem que uma florada bonita não necessariamente é presságio de uma boa safra: este ano, por causa da seca e das altas temperaturas, na maior parte dos cafezais faltaram as folhas verdes, necessárias para sustentar o desenvolvimento dos frutos que vem depois.
Boa parte dos produtores acredita que estas condições climáticas no Sul de Minas nos últimos meses irão impactar a produtividade da próxima safra, mesmo com o retorno das chuvas.
“O impacto no potencial produtivo pode ser grande. Temos que avaliar o que vai acontecer ainda,” diz Luiz Fernando dos Reis, o superintendente comercial da Cooxupé, a maior cooperativa de café do Brasil, com 20 mil produtores associados e faturamento de R$ 6,3 bilhões no ano passado.
As lavouras de café têm sido umas das mais atingidas pelas mudanças climáticas no Brasil. Já faz quatro anos que o clima adverso castiga a cafeicultura. Em 2021, uma das piores geadas registradas no Cerrado Mineiro e no Sul de Minas causou danos irreversíveis aos cafezais. Em 2023, a falta de chuvas e o calor excessivo impactaram as fazendas do Espírito Santo.
Só este ano o Brasil – o maior produtor mundial – deixou de colher 4 milhões de sacas em relação ao previsto. Vietnã e Colômbia, respectivamente o No. 2 e 3 no ranking global de produção, também têm sofrido com o clima, contribuindo para a disparada no preço da commodity no mundo e a redução dos estoques globais.
No Brasil, a saca de 60 quilos do café arábica é cotada a cerca de R$ 1.500, quase o dobro de um ano atrás. Em agosto, o café robusta – um tipo de grão com custo de produção menor – brevemente ultrapassou o valor do arábica, algo que não acontecia há quase 50 anos. No varejo, o cafezinho ficou em média 30% mais caro.
“Como os blend mundiais utilizam parte do robusta do Vietnã, a indústria ficou em dificuldade para manter essa composição, inclusive, tendo que utilizar conilon do Brasil (variedade similar ao robusta) para substituir,” diz Reis. “Daí o motivo do volume das exportações brasileiras de conilon ter aumentado muito junto com preço, o que criou suporte para o preço do arábica também subir.”
Para Steve Wateridge, o chefe de pesquisa do Tropical Research Service/Expana, em Londres, as condições mais secas e quentes não são mais tão favoráveis à produção de café quanto os padrões climáticos de 20 ou mesmo 10 anos atrás.
“Os agricultores estão indo bem por causa dos preços excepcionalmente altos, mas ainda assim o clima impacta os rendimentos, impedindo a maximização da produção, a criação de um grande excedente e a reposição dos estoques,” disse Wateridge.
Para amenizar os efeitos das mudanças climáticas, cada vez mais produtores têm investido em sistemas de irrigação. No Brasil, apenas 20% das lavouras de café contam com irrigação – uma infraestrutura que, além de capital, depende da disponibilidade de água e energia.
Paulo Mesquita, um sócio da Riza Asset Managment, passa boa parte do tempo na Faria Lima mas monitora à distância sua fazenda de café arábica em Três Pontas, Minas Gerais. De uma família ligada ao agro, seis anos atrás Mesquita transformou a propriedade então dedicada à pecuária em uma área com 60 hectares de café totalmente irrigado.
“A produtividade nas lavouras com sistemas de irrigação é 30% superior à das não irrigadas. Em momentos de estresse climático, esse rendimento chega a ser 50% maior,” diz Mesquita, que vendeu as 2.500 sacas que produziu este ano para uma trading.
O clima não é o único fator mexendo com o mercado de café. Outro assunto que tem exercido pressão sobre os preços é a lei antidesmatamento da União Europeia, (EUDR, na sigla em inglês), prevista para entrar em vigor em 30 de dezembro.
A nova regra obriga os compradores europeus a fiscalizar suas cadeias de suprimento para barrar produtos que venham de áreas desmatadas após 31 de dezembro de 2020. No Brasil, a regra atinge os principais produtos da pauta de exportação do agronegócio, como soja, carne e café.
É verdade que a grande maioria das lavouras de café do Brasil foi estabelecida antes do prazo da EUDR, mas a regra atinge outros grandes produtores globais.
“Havia um prêmio EUDR no mercado de café. As pessoas estavam preocupadas que talvez não houvesse café suficiente em conformidade se as regulamentações fossem introduzidas conforme o planejado em 30 de dezembro,” diz Wateridge.
No começo de outubro, a Comissão Europeia pediu ao Parlamento e ao Conselho Europeu o adiamento por 12 meses da implementação da lei, após pressão de vários países, incluindo o Brasil.
O provável adiamento da regulação tirou o senso de urgência dos importadores, acalmando o mercado e reduzindo o preço do contrato futuro em Nova York com liquidação para dezembro.
Isso não muda a percepção geral de que o preço do cafezinho deve se manter alto por um bom tempo ainda.
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