Bruna Botti está chegando lá. Mas os artesãos estão sumindo

Bruna Botti está com medo dos artesãos sumirem da face da Terra.

Com um negócio que depende destes profissionais – que confeccionam manualmente os cerca de 1.500 sapatos que sua marca vende todo mês – a designer paulistana está criando uma ONG para incentivar jovens a aprenderem o ofício.

“O maior desafio é encontrar interessados, pois muitos estão voltados para o mundo digital e a tecnologia,” ela disse ao Brazil Journal. “É um trabalho que exige tempo e dedicação, e as clientes valorizam cada vez mais o toque humano.”

Além de garantir a exclusividade – que é o luxo de cada peça – o trabalho manual reflete os valores de sustentabilidade e autenticidade que a marca Botti promove.

Não à toa suas criações se tornaram um must have entre mulheres paulistas e cariocas em torno dos 50 anos (o perfil médio da clientela) que prezam pelo conforto e um estilo assertivo.

Inspirada pelos crochês de sua avó Rita e as técnicas manuais do artesanato brasileiro, Bruna criou uma marca que transita entre a tradição e a modernidade.

Depois de se formar em moda pela Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo, e se especializar no Fashion Institute of Technology, em Nova York, Bruna trabalhou em marcas renomadas como Alexandre Birman, Paula Ferber e Zeferino.

“Essas experiências foram essenciais para entender o que eu queria – e principalmente o que não queria. Aprendi que é possível conciliar design e conforto sem abrir mão da elegância,” a designer me disse em sua flagship off-Jardins (ela não quis abrir na Oscar Freire).

A decisão de lançar a Botti em 2013 não foi imediata. Bruna precisou escolher entre investir em seu futuro profissional ou numa festa de casamento com seu então namorado. Optou pela carreira. “Foi uma escolha difícil, mas sabia que minha realização estava em criar algo próprio,” disse Bruna.

Com R$ 40 mil e o apoio da família, a grife se diferenciou desde o começo por suas criações feitas à mão, com um estilo forte e atemporal. Bruna ainda se lembra de quando ela mesma levava os sapatos às clientes, estabelecendo uma conexão íntima e pessoal. “Foi uma maneira incrível de entender o que elas queriam, e esse contato direto moldou a identidade da marca,” disse.

A Botti hoje produz em média 1.500 sapatos por mês, com preços que giram em torno de R$ 1.200. Entre os modelos mais vendidos estão a rasteira com tiras trançadas e a sandália com tiras largas e fecho traseiro, ambos exemplares de um design confortável e elegante.

O toque artesanal conquistou o coração das clientes porque “as pessoas estão cansadas da produção em massa. Querem algo especial, e esse é nosso diferencial. Cada sapato carrega um pouco da alma de quem o fez.”

A Botti foge da lógica tradicional de coleções sazonais, como outono/inverno e primavera/verão. Guiada mais pela temperatura do que pelas tendências de moda, a marca lança modelos mais abertos no início do ano, e mais fechados no meio. Essa abordagem permite atender às demandas sazonais sem criar coleções datadas, garantindo que as peças sejam atemporais e possam ser usadas por muitos anos.

Alinhada ao conceito de slow fashion, a Botti fabrica sapatos de couro e palha com técnicas artesanais como crochê e trançados. “Sempre me incomodou o desperdício de materiais na indústria. Busquei formas de reaproveitar tudo o que fosse possível,” disse Bruna.

Para ela, o design não vale nada se não vier junto com a funcionalidade. “Se um sapato machuca, não adianta ser lindo. As mulheres precisam se sentir confortáveis e confiantes. Essa é uma das minhas premissas.”

Para Juliana Maia, que veste celebridades como Monica Martelli e Eliana, a Botti “é feminina, moderna e cool ao mesmo tempo. Consigo usar os sapatos em várias artistas, de diferentes estilos, e isso é raro.”

A expansão da Botti foi impulsionada pela entrada de Rodrigo Strozenberg, marido de Bruna e pai de seus dois filhos, como sócio depois da pandemia. Ele trocou uma carreira consolidada na publicidade para cuidar das áreas administrativa e de marketing da empresa, enquanto Bruna se dedica ao desenvolvimento dos produtos e ao lado criativo da marca. “Temos uma dinâmica muito equilibrada: eu confio na Bruna para as decisões criativas, e ela confia em mim para a parte estratégica,” disse Rodrigo.

A sinergia entre o casal tem sido fundamental para a expansão da Botti, que já conta com duas lojas próprias em São Paulo, quer abrir uma no Rio, tem presença em 20 multimarcas e se prepara para conquistar mercados internacionais.

O showroom em Nova York gerou interesse de compradores do Japão e do Oriente Médio, regiões que apreciam o artesanato de luxo e a exclusividade. (Pelo código de vestimenta dos países muçulmanos, muitas mulheres cobrem o corpo inteiro e deixam só os sapatos à mostra.)

Colaborações com outras marcas também fazem parte da estratégia de crescimento. Uma das parcerias mais recentes foi com a Misci, de Airon Martin, apresentada na São Paulo Fashion Week. “A colaboração foi orgânica. Compartilhamos valores como o apreço pelo artesanal e o desejo de criar algo significativo,” Airon disse ao Brazil Journal.

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