A Jaguar quer voltar a ser desejada. Conheça o plano

GAYDON, Reino Unido – A Jaguar decidiu fazer um reset na sua operação.

O rebranding anunciado há duas semanas deixou a internet em polvorosa (e diversos especialistas sem entender para onde a marca britânica está indo). 

Na noite de ontem, a empresa revelou o que o mercado estava esperando: seu carro elétrico conceito, o Type 00. 

Com um acabamento em tom rosado, um capô de proporções alongadas, perfil fastback característico de modelos cupê e rodas de liga leve de 23 polegadas, a Jaguar quer usar o Type 00 para causar um impacto significativo no setor automotivo.

“Acreditamos que os futuros clientes da Jaguar serão pessoas com uma verdadeira paixão por design, que têm uma mentalidade independente e gostam de experimentar coisas novas,” Rawdon Glover, o managing director da Jaguar, disse ao Brazil Journal.

Não à toa, o Jaguar Type 00 foi apresentado durante a semana de arte de Miami – e o Brazil Journal conheceu o carro na segunda semana de novembro, num evento guardado a sete chaves na sede da Jaguar na cidade inglesa de Gaydon.

Mas apesar do design futurista chamar a atenção, um detalhe importante do anúncio é a autonomia do veículo. 

A Jaguar promete por meio de uma arquitetura elétrica exclusiva que o Type 00 (e os que virão depois dele) poderá andar até 770 quilômetros sem precisar recarregar. Mas se precisar dar uma carga, ele promete 321 quilômetros de autonomia em 15 minutos na tomada. 

Se a Jaguar entregar isso, ela ficará na segunda posição entre os carros com maior autonomia – ultrapassando o Tesla Model S Long Range, hoje o carro com mais autonomia da empresa de Elon Musk. 

“Estamos eliminando barreiras práticas, como a ansiedade de autonomia,” disse Glover. “E há uma lacuna no mercado para carros elétricos que sejam emocionalmente envolventes, tanto no design quanto na experiência de condução.” 

A montadora já está testando um GT de quatro portas com essa tecnologia – que deve ser apresentado ao mercado no fim do ano que vem. 

Até lá, a Jaguar não vai vender nenhum carro novo por decisão própria. 

No mês passado, a empresa colocou em prática outra fase da sua estratégia global chamada de “Reimagine”, que prevê zerar as emissões de toda sua operação até 2039, e decidiu que a Jaguar não venderia mais carros a combustão.

Esse foi o ponto de partida para o “reset” da Jaguar, nas palavras do próprio Glover.

A empresa, de fato, precisava mudar para continuar existindo. E os problemas da Jaguar estão longe de serem novos.  

Quando a Ford comprou a Jaguar em 1999, a montadora americana tentou fazer com que a marca britânica ganhasse mais escala. Um ano depois, a Ford fechou a compra da também britânica Land Rover. 

Resultado: em vez de atender os ultrarricos e celebridades (do calibre de Paul McCartney e a rainha Elizabeth II), a Jaguar passou a lançar carros mais baratos para atingir um público maior e a competir com marcas como BMW e Mercedes. 

Não deu certo, e a Jaguar passou a perder espaço no desejo e no imaginário dos endinheirados. Passou a vender menos carros, e se tornou deficitária. 

Em 2009, no meio de uma das maiores crises da sua história, a Ford decidiu vender a Jaguar e a Land Rover para reforçar o seu caixa – e vendeu com um desconto de mais de 50% (sem contar a inflação) do que tinha pago pelas marcas.

A compradora foi a indiana Tata Motors, que conseguiu fazer a Jaguar voltar a crescer. Com o lançamento de carros como o SUV F-Pace e o sedan XF, a Jaguar saiu de 45 mil carros vendidos em 2011 para cerca de 180 mil unidades sete anos depois. 

Mas esse crescimento não foi sustentável. Em 2023, a montadora vendeu 65 mil veículos – uma redução de 64%. 

Agora, a Jaguar quer poucos (e bons) clientes. Por isso, na nova fase a montadora vai mais do que dobrar o preço dos seus carros – e quer voltar às origens para competir com marcas como Bentley e Aston Martin. 

A pausa de um ano, segundo Glover, vai servir para chamar a atenção desses clientes – e trazer a sensação de escassez.

“A pausa é essencial para transformar a percepção da marca. Muitas pessoas que queremos atrair atualmente têm a impressão de que a Jaguar não é para elas,” disse Glover. “Para reeducá-las, decidimos criar um intervalo claro entre o passado e o futuro.”

Após todo o barulho, a Jaguar precisará provar que a sua estratégia de marketing faz sentido – e não será fácil. 

Nizan Guanaes, por exemplo, definiu a estratégia como uma “barbeiragem” e que espera um “plot twist”.

Cássio Pagliarini, consultor da Bright Consulting e com passagens por grandes empresas automotivas no Brasil, diz que fazer esse facelift profundo pode ser arriscado, ainda mais com a tradição que a Jaguar tem.

“Uma pessoa que pega essa carga emocional que a Jaguar tem e despreza não está bem da cabeça,” disse. 

Com nove décadas de existência, a Jaguar não nasceu Jaguar. A empresa surgiu como SS Cars e precisou mudar de nome em 1945 para não ser associada à organização paramilitar nazista Schutzstaffel, a SS.

Depois do apogeu e da queda, a Jaguar aposta em um futuro ousado para se recolocar no imaginário de seus clientes. Se essa nova estratégia dará frutos, ainda é uma incógnita – mas a montadora não parece disposta a abandonar a disputa.

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