Sete anos depois, a Reforma Trabalhista está em córner

A reforma trabalhista sancionada pelo Presidente Michel Temer em julho de 2017 – um dos grandes avanços recentes na economia – está em córner.

Alguns de seus principais pilares – como a terceirização irrestrita e a prevalência do negociado sobre o legislado – estão sendo derrubados por juízes do trabalho Brasil afora.

Como consequência, o número de processos, que havia caído logo após a reforma, voltou a subir.

O total de ações em aberto chegou a 5,4 milhões ao final de 2023, segundo um estudo recente da FecomercioSP que analisa casos de insegurança jurídica e desrespeito às regras aprovadas há sete anos.

“Os juízes estão estimulando – de uma maneira feroz – a explosão de ações,” José Pastore, especialista em relações do trabalho e coordenador do estudo, disse ao  Brazil Journal.

Pastore, que preside o conselho de emprego e relações do trabalho da FecomercioSP, também falou sobre a Proposta de Emenda Constitucional que reduz a jornada semanal máxima de 44 para 36 horas, dando fim à jornada 6 x 1 e criando a semana de quatro dias de trabalho.

A PEC acaba de conseguir o apoio necessário para começar a tramitar na Câmara. 

Para Pastore, o projeto é “populista, inviável, não tem condições. A folha salarial vai aumentar em 18%. É uma coisa estratosférica.”

Em sua avaliação, os países reduzem a jornada aos poucos, conforme ocorram ganhos de produtividade; no Brasil, porém, este indicador permanece estagnado há – está preparado? – 40 anos.

A Reforma Trabalhista criou um mecanismo para a redução negociada, e ela é possível em setores mais produtivos. “Mas precisamos esperar outro momento para fazer uma mudança generalizada.”

Em 2020, o Supremo Tribunal Federal invalidou as regras de cobrança de honorários periciais e advocatícios para os beneficiários da justiça gratuita. Isso explica o aumento nos processos nos últimos anos?

Foi um dos fatores, mas a decisão do Supremo não foi um liberou geral para conceder gratuidade para todo mundo. Ao contrário, o reclamante precisa comprovar que não tem recurso.

Mas a Justiça do Trabalho está fazendo um liberou geral. A pessoa se apresenta lá e declara que não tem condições de pagar. Pronto, concedida a gratuidade.

Pegamos um caso em que o reclamante tinha um carro BMW. Outro dia duas Harley-Davidson. Um outro ganhava R$ 30 mil por mês.

A gratuidade deveria valer apenas para quem ganha até 40% do teto das aposentadorias do Regime Geral de Previdência Social, o equivalente hoje a pouco mais de R$ 3.100.

Sabe quantos brasileiros ganham acima disso? 15% do total. Vamos combinar que não é algo complicado pedir comprovação de renda.

Esses juízes estão estimulando, de uma maneira feroz, a explosão de ações trabalhistas novamente, em varas de todo o Brasil.

Agora essa situação poderá se agravar, porque o Tribunal Superior do Trabalho acabou de decidir que apenas uma declaração de hipossuficiência econômica para ter o benefício da gratuidade, sem necessidade de comprovação de renda.   

Muitos juízes parecem não se preocupar com as consequências.

Por que isso ocorre? Qual as motivações dos juízes?

É um paternalismo, ou questões ideológicas de querer ajudar sempre a parte mais fraca.

Mas há casos em que não está sendo respeitado o que foi negociado pelos trabalhadores, sindicatos e empresas. Juízes consideram que não houve um acordo adequado.

Acabam desrespeitando um dos principais pontos da nova lei, de prevalência do negociado sobre o legislado.

Que outros pontos da reforma estão sob ameaça?

Um deles é a terceirização.

Há uma série de responsabilidades para a empresa contratante. Mas a lei foi clara. Todas as atividades podem ser terceirizadas, seja atividade meio ou atividade fim.

Muitos juízes estão invalidando a terceirização.

A lei também deu flexibilidade na determinação do horário de almoço, por exemplo. Os empregados podem ter o interesse em sair mais cedo, por vários motivos. Mas esse tipo de acordo tem sido anulado na Justiça do Trabalho, inclusive por ministros dos tribunais superiores, sob a alegação de que é ruim para os trabalhadores.

A flexibilização prevista na nova lei está em risco?

É o que estamos vendo no caso do banco de horas, por exemplo.

Quando o empregado trabalha mais horas em um dia, em lugar da empresa pagar hora extra, há uma compensação. No outro dia o funcionário trabalha menos. É o banco de horas.

No estudo, analisamos o caso das empresas de home care. A jornada de um enfermeiro, de um cuidador, pode variar muito. A empresa fez um acordo com o sindicato para criar o banco de horas. A Justiça anulou.

Aí, o que que acontece? O custo vai em cima da família, que muitas vezes não tem condições. Leva o paciente para o SUS, e a conta vai para o Erário.

É um desrespeito à reforma trabalhista que acaba causando prejuízo para as empresas, para as famílias e para o Tesouro. São bilhões de reais.

Esse risco jurídico afeta o plano de investimento das empresas. Causa uma repercussão em toda a economia.

É muito prejudicial. São decisões que batem no Erário, na inflação.

A reforma prevê também a demissão amigável, em que o trabalhador pode sacar parte do FGTS, mas abre mão do seguro-desemprego. Agora, no entanto, estamos vendo uma alta dos pedidos desse seguro, mesmo com a baixa taxa de desemprego. Por quê?

Muitos trabalhadores, com ajuda de advogados espertos, entram na Justiça do Trabalho e dizem, ‘Olha, a demissão não foi tão amigável assim. Tenho umas duas ou três testemunhas aqui pra provar isso.’

O que que o juiz faz? Condena. Custo adicional para a empresa e para o Tesouro.

Não é fantástico? E agora vemos o Governo tentando controlar esse gasto.

O mercado está superaquecido, não falta emprego para ninguém. Sempre que aquece muito, há mais rotatividade.

As leis são, de um lado, uma garantia para incentivar o crescimento econômico. Mas podem ser também um elemento predatório. Depende de como são aplicadas.

O senhor vê pontos positivos na proposta de acabar com a jornada 6 x 1?

É um projeto inviável, não tem condições.

Por quê?

Quem acompanha a dinâmica salarial sabe que anualmente os aumentos são de 1%, 1,5%, 2%, 3%. Essa é a magnitude de aumento, que é o impacto que dá na folha salarial das empresas. Agora, se você reduz a jornada de 44 para 36 mantendo os salários, a folha salarial vai aumentar em 18%. É uma coisa estratosférica.

Mas a jornada vem caindo em muitos países.

Jornada legal é uma coisa, jornada praticada é outra coisa. Eles mudam a jornada legal com muito cuidado e muito lentamente.

Mas a jornada praticada eles mudam mais depressa.

É uma questão de negociação entre as partes?

Sim, isso está previsto na reforma trabalhista, do sindicato, porque o empregado sozinho não tem força, mas com a ajuda do sindicato ele consegue.

No mundo inteiro isso é feito assim, através de negociação. E no mundo inteiro, a jornada vai reduzindo, aos poucos, com os ganhos de produtividade.

Aqui tem setores nos quais há ganhos de produtividade, são mais eficientes, conseguem negociar uma jornada menor.

Mas a produtividade média no Brasil está estagnada há 40 anos. Então, precisamos esperar uma oportunidade melhor para fazer uma mudança generalizada.

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